Participação política das mulheres e construção do movimento

Problema

Os direitos políticos das mulheres, de participar na tomada de decisões e influenciar as políticas do País, ainda estão longe de serem realizados aos níveis desejados. Por um lado, o governo mostra tendências de limitar o espaço democrático e de não tomar em consideração as posições dos cidadãos, no geral. O governo não tem conseguido aliviar os altos níveis de pobreza generalizada, acentuando, ao contrário, as injustiças sociais e a desigual distribuição da renda, e deteriorando a qualidade dos serviços públicos, apesar de anos de forte crescimento económico e da entrada no País dos grandes investimentos do capitalismo global.

Adicionalmente, o espaço de diálogo entre os dirigentes político-económicos e a sociedade civil está cada vez mais reduzido. O papel da sociedade civil como agente de vigilância e de salvaguarda dos direitos das cidadãs e dos cidadãos, bem como de inovador político e social, está em retrocesso, e os actores da sociedade civil parecem estar menos activos do que há alguns anos atrás, estando descoordenados, dispersos e sem estratégia coerente.

Por outro lado, a extensa concessão de direitos civis, políticos, sociais e económicos no texto constitucional e nas políticas governamentais em favor da igualdade de género, não tem resultado numa efectiva participação política e exercício de direitos de cidadania das mulheres. Moçambique apresenta relativamente grandes proporções de mulheres em altos postos de tomada de decisão: mulheres ocupam quase 40 % dos lugares na Assembleia da República. Porém, no geral as mulheres e as raparigas estão pouco representadas nos processos de desenvolvimento, sobretudo nos órgãos locais, fazendo com que muitas das suas preocupações não sejam satisfeitas. Por exemplo, dos 43 Municípios, apenas 3 são presididos por mulheres. A presença das mulheres no diálogo político ou nos processos eleitorais ainda é muito baixa. Mesmo para as mulheres nos lugares de decisão, em todos os níveis, é um desafio procurar defender duma forma activa e informada os interesses das mulheres.

De igual modo, Moçambique ratificou vários tratados dos direitos das mulheres, e aprovou várias políticas de género, em princípio assumidas pelo governo, para promover a participação da mulher nos processos de desenvolvimento, mas tem se verificado que a sua implementação não se faz sentir em pleno.

Causas do problema

A limitada participação das mulheres tem como causas os factores históricos: a tradição e os parâmetros legais juntos determinam os limites dos direitos, obrigações e liberdades das mulheres. O patriarcado tem colocado obstáculos para a participação política e o exercício pleno da cidadania das mulheres, impedindo que elas possam ter as mesmas oportunidades como os homens nas esferas económica, política e social. Por exemplo, a fraca escolaridade leva as mulheres a terem baixa auto-estima e não se pronunciarem publicamente, atitude encorajada pelas regras de comportamento tradicionais. Assim, a questão da consciência cidadã não está muito presente nas mulheres e raparigas, porque falta o conhecimento sobre os direitos e deveres e sobre seu papel como agente de mudança no seu contexto social e político.

Para além da falta de recursos e da ineficiência gerais, são os mesmos valores do sistema patriarcal, persistentes na sociedade de hoje, que estão por detrás da fraca implementação das leis e políticas de género aprovadas, e do modelo de governação pouco democrático, que não considera na sua acção as necessidades da maioria, servindo os interesses do capitalismo.

Mudança necessária

Não será possível aumentar a voz das mulheres sem alargar o espaço democrático no geral, tanto no sistema representativo formal como na interacção entre o Estado e os actores não estatais. Será necessário encontrar formas de aumentar a participação voluntária das cidadãs e dos cidadãos e reforçar desta feita a acção da sociedade civil na sua tarefa de monitorar o governo e exigir a prestação de contas das suas acções.

Apesar de Moçambique estar a registar crescimento económico acelerado, o nível de pobreza continua alto, afectando as mulheres e raparigas, porque o crescimento é baseado num modelo não inclusivo e de exploração e apropriação, além de que as agendas que não incluem as suas necessidades. Por isso, actores da sociedade civil em Moçambique, como em outros países, estão a questionar o modelo de desenvolvimento adoptado pelo seu governo. Para poder enfrentar a globalização desenfreada, estes movimentos sociais precisam de fortalecer-se buscando sinergias e alianças. O Fórum Mulher defende que as mulheres devem ser autónomas e solidárias umas com as outras em relação à defesa dos seus interesses. Isto passa por elasautodefinirem-se como sujeitos no processo e envolverem-se cada vez mais nestes espaços dos movimentos sociais, para que possam promover mobilizações para acções de advocacia, definindo as questões, apontando os problemas e propondo alternativas.

Quanto ao sistema representativo formal, é preciso aumentar a representação das mulheres na tomada de decisões desde o nível local – os comités de gestão de água e de recursos naturais, os conselhos consultivos, as assembleias municipais – até ao nível nacional. É necessário que as mulheres, no seu meio cultural e social, determinem a forma de abordagem política que servirá os seus interesses. No entanto, não basta estar representada em números suficientes, é imperativo que as mulheres nas posições de decisão estejam motivadas e tenham os conhecimentos adequados para promover os interesses dos diferentes grupos de mulheres, tal como expressados por elas.

Para isto acontecer, é necessário que haja uma consciência política e de cidadania por parte das mulheres e raparigas, que significa que devem ter conhecimentos sobre seus direitos e deveres. Isto está aliado ao facto de terem acesso a informação e ao conhecimento através do seu envolvimento nos processos formativos e de debates que são relevantes para a consolidação da sua consciência cidadã.Por outro lado, é importante fortalecer as alianças entre as mulheres na Sociedade Civil e aquelas que ascenderam aos lugares de tomada de decisão para ampliar os espaços de influência política.

Será necessário, ainda, que haja vontade política de promover a igualdade de género, ou seja, de implementar as leis e políticas assumidas pelo Estado, sendo que todos os actores políticos, desde o governo, os partidos políticos, as instituições académicas, o sector privado, entre outros, estejam interessados em adoptar a perspectiva de género quando se trata de abordar assuntos do interesse nacional. É necessário que na divulgação do quadro legal se destaquem os direitos das mulheres. Esta vontade política pode ser promovida através de monitoria independente do cumprimento dos acordos internacionais e das políticas de género nacionais, para divulgar o desempenho do governo neste sentido.

Papel do FM

Neste contexto, onde os direitos políticos das mulheres, e dos cidadãos em geral, não são respeitados, o trabalho do FM não pode ser separado da acção da restante sociedade civil na responsabilização do governo, e na exigência de transparência e de distribuição equitativa dos recursos da nação, a fim de contribuir para a paz, a estabilidade e o bem-estar. O desafio será como activar, incentivar e inspirar a sociedade civil moçambicana a criar novas alianças e parcerias para agir de forma coordenada e coerente na defesa dos direitos dos cidadãos e, em particular, dos direitos das mulheres. Um dos papéis do FM neste contexto seria o de mobilizar e orientar os outros parceiros em como integrar a perspectiva de género na sua acção, aproveitando a sua abrangência e contactos, para que a defesa dos direitos das mulheres faça parte da agenda de toda a sociedade civil.

Isto implica que o Fórum Mulher articula com organizações, redes e movimentos da sociedade civil para influenciar as políticas públicas na redução da pobreza, na distribuição equitativa dos

recursos nacionais e na promoção da justiça social, integrando a perspectiva de género nas posições comuns da sociedade civil. Quer dizer que o FM deve conseguir convencer os restantes actores da sociedade civil sobre a necessidade de integrar a igualdade de género nas suas estratégias e intervenções, percebendo que a opressão baseada no género é uma causa fundamental da pobreza e injustiça social.

A luta feminista contra o patriarcado tem colocado o Fórum Mulher em aliança com outros actores, ao nível global, que lutam pela causa dos direitos humanos das mulheres, sendo membro da Marcha Mundial das Mulheres e aliado a outros movimentos sociais ao nível global e regional. Será importante compartilhar e divulgar os conhecimentos e experiências trazidos destas interacções para contribuir no processo de construção do movimento feminista, na criação da capacidade de liderança e na elevação da consciência política das mulheres e raparigas no país, afim de contribuir para o fortalecimento do activismo da sociedade civil.

O Fórum Mulher vai hospedar o Secretariado Internacional da Marcha Mundial das Mulheres a partir de 2014 e durante a vigência deste Plano Estratégico, tornando-se esta oportunidade para fortalecer a acção política do movimento das mulheres em Moçambique, mas também a sua articulação a nível regional e internacional, bem como a construção de alianças com outros movimentos como a Via Campesina que recentemente transferiu o seu Secretariado de Jacarta para o Zimbabwe.

O Fórum Mulher também tem adquirido experiência em projectos passados sobre a promoção da participação política das mulheres nas diferentes instâncias formais de tomada de decisões, que valerá a pena aproveitar multiplicando e replicando as boas práticas e aprendizagens. De igual modo, já tem vindo a monitorar as políticas públicas de género, através dos relatórios de CEDAW, do Protocolo da SADC, etc., acção que poderá intensificar e alargar no futuro. Desde 2011, o FM é o Ponto Focal da Aliança do Protocolo de Género da SADC.

Como questões prioritárias, o FM salientará:

A contribuição proactiva à acção conjunta da sociedade civil em defesa dos direitos das cidadãs e dos cidadãos, integrando nela a perspectiva de género;

A sensibilização, capacitação e mobilização para a participação de mulheres nos espaços formais e informais de influência política;

O desenvolvimento da monitoria da implementação dos acordos internacionais e das políticas nacionais de género afim de avaliar o seu cumprimento;

O fortalecimento da participação nacional nos movimentos sociais internacionais, particularmente na Marcha Mundial das Mulheres, em colaboração com o Secretariado Internacional hospedado em Moçambique.

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