Dados oficiais do 1º trimestre do ano em curso, indicam que 6.300 casos de violência foram atendidos, sendo 4.082 criminais, 1.869 cíveis e 349 de outra natureza. Dos casos globais registados pelos Gabinetes e Secções de Atendimento às Vítimas de Violência, configuraram como vítimas, 3.318 mulheres, 646 homens, 2.048 crianças e 288 idosos. Associa-se à situação da violência, a precarização da saúde das mulheres e raparigas com o registo de 2000 a 2500 casos ano de fístula obstétrica.
É neste contexto que o Fórum Mulher, sob moderação da coordenadora do programa de Violência Baseada no Género (VGB), Graça Julio, levou a cabo um debate virtual sobre “Violência contra Mulheres e Raparigas no contexto da COVID-19”. Visando discutir e encontrar alternativas para enfrentamento da violência em contexto específico de confinamento imposto pela pandemia da COVID-19.
Na ocasião, Bela Lithule, advogada e coordenadora da Assistência Jurídica na AMMCJ, referiu que a questão da violência doméstica, principalmente na situação de confinamento em que actualmente o país se encontra, poderá agravar dois tipos de violência, a física e a psicológica. Sendo que um dos factores que poderá ser motivo para desencadear estes dois tipos de violência é a escassez de recursos para fazer face a algumas necessidades familiares, considerando que mais da metade da população nacional é de média e baixa renda. Bela alerta para o monitoramento do nível de denúncia, pois entende que devido ao confinamento, podem aparecer números fictícios, extremamente reduzidos da violência, que não reflectem a realidade, pelo que, recomenda a busca de novas alternativas para dar voz à mulher vítima de violência.
Com o novo contexto imposto pela Pandemia da COVID-19, aumenta a probabilidade de ocorrência de violência doméstica pois os agressores ficam confinados em casa com as suas vítimas; crescem os crimes de violência sexual contra mulheres e crianças (dentro e fora de casa) e as uniões prematuras de crianças.
A Psicóloga da Muleide, Paula Barreto, alerta para o facto de que as restrições devido à pandemia deixam as pessoas com medo, impotência, irritabilidade, tristeza e solidão e neste quadro na maior parte das vezes, encontramos pessoas que já vem sendo vítimas da violência e outras que começam a ser vítimas devido ao confinamento.
Para fazer face a este cenário, a Muleide oferece suporte psicológico e disponibilizou uma linha telefónica que pode ser usada para denúncia de casos. O número é 841956959. Adicionalmente, a Muleide possui um sistema de referência para os casos que precisam de um estudo mais profundo, possui igualmente, quatro núcleos que funcionam Província de Maputo e que auxiliam na identificação de casos de violência. Os núcleos estão situados na Matola-Gare, Bairro Jorge Demitrove, Bobole e Manhiça, na província de Maputo.
Associação Hixikan’we, organização que apoia pessoas vivendo com HIV/Sida também buscou novas alternativas para responder ao novo contexto. “Criamos um grupo de 30 activistas que vão às unidades sanitárias para facilitar o levantamento de medicamentos. Para a questão das crianças chefes de família, oferecemos marmitas, tendo em conta as medidas de prevenção. Gostaríamos de apelar não só apoio material, mas também apoio psicológico para idosos e para as mulheres que vivem com HIV”, disse. Contudo, apesar desse esforço todo, Isabel Sofia, assistente social do Hixikan’we, lamenta o nível de desistência ao tratamento antirretroviral por parte das mulheres. “Neste momento de confinamento, as mulheres que vivem com HIV, por mais que conheçam os contactos para efectuar denúncias contra violência, elas não se sentem confortáveis para assim fazê-lo devido ao medo e à dependência económica. Algumas afirmam que foram entregue medicação equivalente a três meses para medicar durante este período, mas elas afirmam não estar em condições para gerir toda medicação sem apoio hospitalar. Estamos a registar uma desistência massiva, por parte de mulheres, ao tratamento antirretroviral o que pode fazer com que, por exemplo, mulheres grávidas possam gerar filhos seropositivos”, lamentou.
Do Gabinete de Atendimento à Família e Menores Vítimas de Violência, Delfino Raimundo, referiu que apesar de o Gabinete não ter uma linha de emergência específica para as vítimas entrarem em contacto, o Comando Geral e os Gabinetes de Atendimento estão organizados para responder a possíveis caos de violência. “Nós temos um plano para assegurar o atendimento, receber denúncias e encaminhar as vítimas para os serviços de apoio psicológico e jurídico. Não temos uma linha de emergência específica para as vítimas entrarem em contacto mas estamos organizados de tal maneira que cada distrito deste país tenha um telemóvel para ajudar as vítimas localmente”, disse. “Nos últimos três meses temos nos esforçado para expandir mensagens e medidas que ajudem na mitigação da violência doméstica. Temos equipas de resposta móvel para apoio às vítimas e estamos a potenciar plataformas digitais para facilitar denúncias. Divulgamos estas plataformas e números de telefones de cada distrito através dos meios de comunicação social”, acrescentou.