“Ser aquela organização fechada que queria garantir serviços básicos para as crianças não nos permitia crescer”, Dalila Macuácua, Directora Executiva da Associação Sócio Cultural Horizonte Azul (ASCHA),

 

O Fórum Mulher é uma Rede feminista de organizações da Sociedade Civil que promove a igualdade de género e os Direitos Humanos das Mulheres em Moçambique. Tem representação a nível nacional através de Fóruns e Núcleos provinciais.

Como rede e com papel de coordenação, o FM tem impulsionado o crescimento de várias organizações graças as acções levadas a cabo pelo programa de Fortalecimento Institucional com vista ao melhoramento das acções da rede. No ano passado completou 25 anos de existência. Anos marcados por vários desafios e conquista que até hoje os seus membros celebram. O percurso histórico do FM foi contado na última edição do boletim Informativo do FM por umas das fundadoras do FM, Terezinha Da Silva.

Nesta edição, a história continua, não mais do ponto de vista de seu surgimento, mas de mudanças nos seus membros.

Assim, nesta entrevista, Dalila Macuácua, Directora Executiva da Associação Sócio Cultural Horizonte Azul (ASCHA), conta como ser membro do FM ajudou para o crescimento da instituição  que lidera e as mudanças que dai brotaram

FM. Contem-nos o que é a Associação Sócio Cultural Horizonte Azul, quando foi criada e quando decidiu ser membro do FM?

DM. A Associação Sócio Cultural Horizonte Azul é uma associação de jovens, em particular de raparigas jovens que militam em prol dos DHM, na cidade de Maputo, mas com tendência de emigrar para outras zonas do país. Tem uma identidade feminista, ainda em processo de construção. A ASCHA acredita que quando meninas e meninos, homens e mulheres tiverem as mesmas oportunidades em relação a recursos afectivos, financeiros e matérias, estes podem ser sujeitos de direito sem a subjugação de um sexo em relação ao outro.   A Horizonte Azul foi criada em 2005. Na primeira fase era para garantir serviços básicos para crianças, jovens e raparigas órfãs e vulneráveis das zonas periurbanas.  Actualmente, passados 7 anos, identifica-se como organização de participação e engajamento cívico das mulheres jovens. No entanto, essa mudança só foi possível quando nos tornamos membros do FM, em 2011.

FM. O que vos motivou a concorrer para ser membro do FM?

DM. Foi o facto de este ser uma rede que milita em prol dos DHM e congrega varias organizações, com quais nós acreditamos que podemos fazer a diferença e nos complementarmos naquilo que são as nossas acções. Por outro lado, ser membro nos permitia ter formações e informações sobre DHM, DSR, VBG. Ser membro do FM só nos dava vantagens. Então continuar a ser aquela organização fechada que queria garantir serviços básicos para as crianças não nos permitia crescer, primeiro como pessoas e segundo como organização. Portanto uma das mais-valias que ser membro do FM nos deu foi ter acesso a essa adversidade de pessoas, de organizações, e dos grupos entre gerações que permitiram que raparigas e mulheres jovens das áreas periurbanas, rural e urbana pudessem conectar-se e lutar pelos DH. Esse foi uma grande diferencial

FM. O que buscavam quando decidiram se candidatar?

DM. Quando nos afiliamos ao FM buscávamos o fortalecimento na componente de DHM, queríamos aprender sobre como liderar as nossas organizações; como interagir e participar em espaços que falam e discutem sobre nossas vidas; ter contacto com pessoas que já trabalhavam com DHM e aprender sobre feminismo.

Queríamos ter acesso a academias que já conheciam feminismo e DHM que podiam melhorar a nossa percepção sobre o que pretendíamos fazer. E através do FM conseguimos aceder a outras organizações que nos amadrinham. E se não tivéssemos feito parte do FM acho que não teríamos conhecido essas organizações.

FM. Que mudanças os processos formativos do FM trouxeram para a ASCHA

Quando nos tornamos membros do Fórum Mulher fomos desafiadas a nos percebermos e conhecermos como organização. Fomos desafiadas a entendermos o que tínhamos como visão e missão institucional. Igualmente, fomos questionadas sobre como é que queríamos criar condições, para que o nosso grupo alvo torne-se um/a sujeito/a político/a até formarmos este movimento de raparigas e mulheres jovens.

Esse exercício nos permitiu pensar e repensar na nossa existência como organização. Sobre o que queremos ser e como queríamos criar espaço ou garantir que mulheres jovens estejam engajadas em todos os espaços de pertença. E graças ao FM conseguimos redefinir e reformular nossos valores, missão e objectivos institucionais.

FM. Qual foi o momento mais marcante deste processo para a ASCHA? 

DM. Quando entramos no FM tivemos a oportunidade de participar do “Despertar” que foi um programa que nos ajudou a trazer as vozes do nosso grupo alvo, permitindo que elas ocupem espaços e tragam suas demandas. Graças ao “Despertar” tivemos o nosso primeiro computador, com base num financiamento de 30.000,00 meticais.

FM. Qual foi o maior ganho que a ASCHA teve ao longo desses anos que é membro do FM?

Um dos primeiros ganhos que tivemos foi a oportunidade de ter essa adversidade de pessoas e organizações, ter grupos intergeracionais que faziam parte da rede. O FM nos permitiu alcançar o crescimento que tanto desejávamos.

Graças ao FM nossas portas se abriram, conhecemos organizações que hoje nos apadrinham como o caso da Wlsa Moçambique e a ONU mulheres. São organizações que sem o contacto com o FM se calhar nunca teríamos conhecido. Por isso o FM é como uma base para nós, nos construímos, nos erguemos e nos formamos dentro do FM.

 FM. Quais foram os principais desafios de trabalhar em rede?

DM. ASCHA entrou no FM e encontrou pessoas com diferentes socializações, tivemos problemas de relações interageracionais porque a ASCHA trazia raparigas que falavam de forma que as pessoas mais velhas entendiam que fosse constrangedor. Haviam organizações que estavam a mais tempo na rede que nós tivemos que lura para ter o nosso espaço, o respeito e o reconhecimento. No entanto mais do que desafios encontramos oportunidades. Fomos bem acolhidas, lembro que altura a presidente do Concelho de Direcção era a Isabel Casimiro que nos ajudou na nossa inserção, a Graça Sam, na época Directora Executiva, também nos deu muita força e a Nzira que era Directora de programa ajudou-nos a encontramos na rede. Hoje temos demandas diferentes, a ASCHA cresceu graças ao FM e tem estado a fazer seu próprio caminho, consciente que o FM é o lar para onde sempre voltaremos. A conjuntura política mudou, o sistema esta cada vez mais fechado, e vem interferindo cada vez mais no trabalho da rede. E, nesta fase, lembramos o que aprendemos no FM que é a necessidade de trabalhamos juntas e se dermos unidas.

FM. Que Lições aprendidas ao longo destes anos?

DM. Aprendemos muito a exercitar a escuta activa, que temos de estar aptas a ouvir sem julgar e a falar sem condenar. Trabalhar em rede também nos fez aprender a construir agendas colectivas e alternativas face aos problemas do dia-a-dia como organizações de mobilização. Percebemos a necessidade de respeitar a pessoa humana, a orientação sexual, mas acima de tudo que juntas somos mais fortes, a sermos perseverantes nessa luta pelos DHM.

Com o FM aprendemos a dar valor ao nosso trabalho e a perspetivarmos o futuro. Graças ao FM as portas se abriram e ate fomos recomendadas ao Muva por alguém que esteve a trabalhar connosco no “Despertar”, que a Solange.

FM. Que recomendações gostaria de deixar para o FM na qualidade de coordenadora da rede?

DM. Gostaria que o FM fosse cada vez mais de todas e todos, seria um ganho, que o FM resgatasse as dinâmicas de construção e mais ousadia. A conjuntura mudou, mas há uma necessidade de nos reconectar. Ainda tenho boas memórias da primeira marcha dos povos, onde tivemos uma avalanche de pessoas e raparigas a marcharem, par mim foi uma marca, nos construímos aquilo juntas, articuladas pelo FM. Os membros devem voltar a ser formamos, se reconectem, façam projectos em consórcio, mas que estivéssemos juntas.