Lançada campanha contra violência sexual

“Sou Ntavase”

Fui violada, exijo justiça

Reagindo à enorme vaga de crimes sexuais contra raparigas e mulheres, noticiados pelos media, um grupo de organizações da sociedade civil lançaram uma campanha contra a violência sexual, designada “Sou Ntavase”, pseudónimo de uma menina de 10 anos que foi violada por um adulto de 36 anos.

A Associação Sócio-Cultural Horizonte Azul (ASCHA), o Fórum da Sociedade Civil para os Direitos da Criança (ROSC), a associação Mulher e Lei na África Austral (WLSA) e a Associação da Mulher Moçambicana de Carreira Jurídica (AMMCJ), lançaram hoje – 24 de Junho de 2020 – a Campanha “Sou Ntavase”, para reagir contra a violência sexual contra mulheres e raparigas.

Veja a seguir o Comunicado de Imprensa na íntegra.

Fonte: https://www.wlsa.org.mz/lancada-campanha-contra-violencia-sexual/#more-14103

 

COMUNICADO DE IMPRENSA

Campanha: “Sou Ntavase”

Fui violada, exijo justiça

Conquistamos a independência política,
mas não a independência dos nossos corpos

Estamos a comemorar 45 anos da Independência Nacional. Nestes 45 anos, nós, raparigas e mulheres, celebramos conquistas, mas também ainda enfrentamos uma dura realidade carregada de muita violência e injustiça.

Celebramos a aprovação de políticas e leis sendo de destacar a Lei da Família, a Lei das Sucessões, a Estratégia Nacional de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras, a Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras e a revogação do Despacho nº 39/2003/GM/MINED, entre outros. Celebramos a presença de mais mulheres em lugares de tomada de decisão.

Mas a realidade mostra-nos que muitas das expectativas foram defraudadas. Defraudou-se o ensejo de uma vida com dignidade e condições decentes para todas e todos, faltou-se com a palavra para garantir mais justiça e igualdade, para que os cidadãos e as cidadãs tivessem mais trabalho, educação e saúde.

Com a independência eliminamos o colonialismo, mas falta ainda cumprir as promessas feitas. E para nós, mulheres, é patente que não alcançamos a independência dos nossos corpos e das nossas vidas. A violência de género é endémica e acompanhada pelo seu cortejo de argumentos desculpabilizantes dos agressores e incriminadores das vítimas.

Com o COVID 19, aumenta a violência doméstica pois os agressores ficam confinados em casa com as suas vítimas, crescem os crimes de violência sexual contra mulheres e crianças (dentro e fora de casa) e as uniões prematuras de crianças, enquanto que as instituições que deveriam enquadrar estes crimes, na saúde e na justiça, continuam a prestar um mau atendimento às vítimas. Esse mau atendimento resulta sobretudo dos preconceitos e das ideias que os agentes têm do lugar subordinado das mulheres e crianças na família, e não inteiramente por causa da falta de meios, como às vezes se quer fazer crer. As instituições da justiça ainda estão muito aquém de prover às mulheres o direito à vida, à dignidade e a viver sem violência.

Por isso é que, se a maioria das pessoas ainda espera pela Independência Nacional prometida, nós, mulheres, aguardamos com mais ansiedade a conquista de uma independência que represente também segurança, igualdade e justiça para todas e todos. Se todas e todos nos sentimos lesadas/os por sucessivos governos que não têm conseguido trazer a paz e a prosperidade tão desejada, nós, mulheres, ainda nos debatemos com uma desigualdade flagrante em casa, nas comunidades, nas escolas e em outros espaços, onde frequentemente somos alvo de agressões de vária índole, todas justificadas em nome da manutenção da ordem e da cultura. E, para culminar, as instituições que deveriam repor a justiça, cuidar das vítimas e criminalizar os agressores, são em grande parte inoperacionais e reproduzem o discurso da subordinação que remete as mulheres para uma subalternidade abjecta e excludente dos seus direitos como seres humanos.

A nossa Campanha “Sou Ntavase”, inspirada numa menina de 10 anos violada sexualmente em 2019 e que até hoje clama por justiça, é apoiada por mulheres e homens que defendem a igualdade de direitos e a democracia no nosso país, e tenta chamar à atenção exactamente para esta inoperância da maioria dos serviços de apoio e enquadramento dos crimes de violência de género.

É tempo de exigir um serviço de qualidade, é altura de dar a devida prioridade a estes serviços, que devem ser dotados de meios humanos e materiais suficientes e cujos agentes devem ser pessoas sensibilizadas para a igualdade e no respeito dos princípios democráticos e de equidade da nossa Constituição. É tempo de dizer NÃO à tolerância com que são olhados os crimes contra raparigas e mulheres! Não ao assassinato de raparigas e mulheres! Não à inoperância do sistema de justiça!

Assim, reivindicamos não só mais democracia, como também:

  • Aplicação das leis que protegem mulheres e crianças contra a violência de género;
  • Avaliação e monitoria do funcionamento das instituições que devem cuidar das vítimas, criminalizar os agressores e repor a justiça;
  • Dotação de recursos humanos e materiais suficientes para que essas instituições possam funcionar de maneira adequada.

Exigimos maior empenho de todas as autoridades da saúde, educação, polícia, emprego e outros sectores, para que a igualdade de género se possa concretizar desde a educação das crianças até à vida adulta.

POR MAIS JUSTIÇA E IGUALDADE!

ACABEMOS COM A VIOLÊNCIA DE GÉNERO!

 

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